Observava atentamente como os meus pais escreviam sobre aquela folha para seguir à risca quando eu crescesse e chegasse a minha vez. Ao lado do último zero do valor, no topo à direita, recomendava-se acrescentar um sustenido.
Em seguida, escrever por extenso o valor. Parecia tema do colégio: trezentos e quarenta e cinco cruzeiros e oitenta e nove centavos. Após assinar e marcar a data, o pai fazia rapidamente uma série de traços paralelos que davam toda a elegância para aquele rito. “Tem que cruzar”, dizia ele.
Às vezes, o atendente pedia que se acrescentasse no verso o número de um telefone. Quantos cheques sem fundos voaram no mercado até então, embora isso não significasse muito para quem planejava um calote. Em outras ocasiões, o pai pedia para que a pessoa também assinasse atrás. “Tem que endossar”, dizia ele.
O tempo passou e chegou a minha vez. Com 17 anos e após ingressar no meu primeiro emprego, recebi um talão de cheques novinho do Banrisul. Decidi estrear na Manlec, após insistência da mãe em comprar uma escrivaninha nova para o meu quarto. Levei a caneta de casa, afinal seria o ápice da minha fase adulta. Pela primeira vez, aquele garotinho que brincava de Banco Imobiliário assinaria um cheque de verdade. Poderoso? Rico? Que nada!
Esqueci que o meu salário era tão minguado que não foi possível pagar aqueles R$ 350 à vista. Preenchi 10 cheques de R$ 35. O braço cansou, a graça acabou e conheci a verdadeira sensação de que a vida real na fase adulta não é apenas o charme de escrever um papelzinho.
Crédito ou débito? Hoje em dia, até prefiro ouvir essa pergunta.